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Glória Maria, jornalista e ícone da TV, morre no Rio aos 73 anos

Na Globo desde 1970, a carioca foi a 1ª repórter a entrar ao vivo e em cores no Jornal Nacional. De 1998 a 2007, ela apresentou o Fantástico e, desde 2010, integrava a equipe do Globo Repórter.

03/02/2023 às 08h42 Atualizada em 03/02/2023 às 09h48
Por: Carlos Nascimento Fonte: g1.globo.com/ | cnnbrasil.com.br/
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Glória Maria, jornalista e ícone da TV, morre no Rio aos 73 anos

A jornalista Glória Maria, ícone da TV brasileira, morreu no Rio de Janeiro nesta quinta-feira (2). “É com muita tristeza que anunciamos a morte de nossa colega, a jornalista Glória Maria”, informou a TV Globo, em nota.


Em 2019, Glória foi diagnosticada com um câncer de pulmão e fez um bem-sucedido tratamento com imunoterapia. Tempos depois, ocorreu metástase no cérebro, e a jornalista teve de passar por cirurgia, que também teve êxito.

“Em meados do ano passado [2022], Glória Maria começou uma nova fase do tratamento para combater novas metástases cerebrais que, infelizmente, deixou de fazer efeito nos últimos dias, e Glória morreu esta manhã, no Hospital Copa Star, na Zona Sul do Rio”, afirma o comunicado da emissora.

Primeira jornalista a entrar ao vivo e em cores no Jornal Nacional, Glória Maria foi pioneira inúmeras vezes. Esse pioneirismo é reconhecido como inspiração para mais de uma geração de mulheres negras.

Ao longo de cinco décadas de carreira, Glória Maria mostrou mais de 100 países em suas reportagens e protagonizou momentos históricos. Entrevistou chefes de Estado e celebridades como Michael Jackson e Madonna.

Também cobriu a Guerra das Malvinas, em 1982; a invasão da embaixada brasileira do Peru por um grupo terrorista, em 1996; os Jogos Olímpicos de Atlanta, também em 1996; e a Copa do Mundo de 1998, na França.

Na TV Globo deste 1970, passou ainda por Bom Dia Rio, RJTV, Jornal Hoje, Fantástico e Globo Repórter, último programa do qual fez parte.   

Glória Maria Matta da Silva nasceu no Rio. Filha do alfaiate Cosme Braga da Silva e da dona de casa Edna Alves Matta, estudou em colégios públicos e sempre se destacou. "Aprendi inglês, francês, latim e vencia todos os concursos de redação da escola", lembrou em entrevista ao Memória Globo.

A jornalista deixa duas filhas: Maria, de 15 anos, e Laura, de 14, adotadas em 2009.

Vida e carreira


No início da juventude, Glória Maria também chegou a conciliar os estudos na faculdade de Jornalismo da Pontifícia Universidade Católica (PUC-Rio) com o emprego de telefonista da Embratel.

Em 1970, foi levada por uma amiga para ser radioescuta da Globo do Rio. Naquele tempo sem internet, ela descobria o que acontecia na cidade ouvindo as frequências de rádio da polícia e fazendo rondas ao telefone, ligando para batalhões e delegacias.

Na Globo, tornou-se repórter numa época em que os jornalistas ainda não apareciam no vídeo. A estreia como repórter foi em 1971, na cobertura do desabamento do Elevado Paulo de Frontin, no Rio de Janeiro. “Quem me ensinou tudo, a segurar o microfone, a falar, foi o Orlando Moreira, o primeiro repórter cinematográfico com quem trabalhei”.

Glória Maria trabalhou no Jornal Hoje, no RJTV e no Bom Dia Rio. Coube a ela a primeira reportagem do matinal local, há 40 anos, sobre a febre das corridas de rua.

No Jornal Nacional, foi a primeira repórter a aparecer ao vivo. Cobriu a posse de Jimmy Carter em Washington e, no Brasil, durante o período militar, entrevistou chefes de Estado, como o ex-presidente João Baptista Figueiredo.

“Foi quando ele [João Figueiredo] fez aquele discurso ‘eu prendo e arrebento’ – para defender a abertura [1979]. Na hora, o filme [para fazer a gravação da entrevista] acabou e não tínhamos conseguido gravar", lembrava ela.

"Aí eu pedi: ‘Presidente, é a TV Globo, o Jornal Nacional, será que o senhor poderia repetir?'. 'Problema seu, eu não vou repetir’, disse Figueiredo. O ex-presidente dizia para a segurança: ‘Não deixa aquela neguinha chegar perto de mim'."

Sucesso no Fantástico

A partir de 1986, Glória Maria integrou a equipe do Fantástico, do qual foi apresentadora de 1998 a 2007. Ficou conhecida pelas matérias especiais e viagens a lugares exóticos, e por entrevistar celebridades como Michael Jackson, Harrison Ford, Nicole Kidman, Leonardo Di Caprio e Madonna.

Com a cantora, Glória teve um encontro que definiu como especial. “Eu saí daqui, e diziam que a Madonna era difícil. Foi antipaticíssima com a Marília Gabriela e debochou do seu inglês”. Ao chegar, Glória Maria foi informada de que tinha quatro minutos para entrevistar Madonna.

A repórter contou que entrou em pânico. Mas, na hora, falou: “Olha, Madonna, eu tenho quatro minutos, vou errar no inglês, estou assustada, acho que já perdi os quatro minutos.” Para sua surpresa, a estrela virou-se para a equipe técnica e disse: “Dê a ela o tempo que ela precisar.”

Viagens a mais de 100 países

Para o Fantástico, a jornalista viajou por mais de 100 países, passando pela Europa, África e parte do Oriente, quando mostrou um mundo novo ao telespectador.

Foi a repórter que entrou no ar ao vivo, na primeira matéria com imagem colorida do Jornal Nacional, em 1977, mostrando o movimento de saída de carros do Rio de Janeiro, em um fim de semana. Naquele dia, foram usados equipamentos portáteis de geração de imagens.

Na primeira cena, a lâmpada queimou e a repórter passou seu primeiro sufoco no ar.

“Eu estava dura, rígida, porque não podia errar. Era a primeira entrada ao vivo. Faltavam cinco, dez minutos, era o técnico que ficava com o fone para me dar o ‘vai’. Quando a lâmpada queimou, faltava um minuto para a entrada ao vivo. O jeito foi acender a luz da Veraneio (carro usado pela emissora nas reportagens).”

O repórter cinematográfico e a repórter tiveram que ficar de joelhos, com o farol no rosto de Glória Maria, e a matéria entrou no ar.

Primeira transmissão em HD

Em 2007, ao lado do repórter cinematográfico Lúcio Rodrigues, a jornalista realizou a primeira transmissão em HD da televisão brasileira. Foi uma reportagem no Fantástico sobre a festa do pequi, fruta de cor amarela adorada pelos índios Kamaiurás, no Alto Xingu.

Volta ao mundo no Globo Repórter

Após dez anos no Fantástico, Glória Maria tirou dois anos de licença para se dedicar a projetos pessoais, como as viagens à Índia e à Nigéria, onde trabalhou como voluntária. Nesse período, adotou as meninas Maria e Laura e, ao retornar à Globo, em 2010, pediu para integrar a equipe do Globo Repórter, último programa do qual fez parte.

Estreou com a matéria “Brunei Darussalam: A Morada da Paz”; um ano depois fez “Butão: O País da Felicidade” – as duas matérias sobre o pequeno sultanato no Sudeste Asiático, na fronteira com a Malásia.

Em 2010, esteve no Grand Canyon, nos Estados Unidos, quando andou de balão e desceu de bote o Rio Colorado. No mesmo ano fez Duas Chinas, também para o Globo Repórter, e apresentou ainda o especial de Roberto Carlos na Praia de Copacabana.

Glória foi escolhida pelo Rei para a entrevista que concedeu em sua residência e na qual ele acabou cantando para ela. Em 2011, apresentou o show que o cantor fez em Jerusalém. Na ocasião, Roberto Carlos tirou a apresentadora para dançar.

Em 2012, a jornalista mostrou o Oásis da paz em Omã e fez um passeio com camelos pelo deserto. Logo depois, passou por Dubai.

A França foi um dos países visitados em 2013. Na ocasião, foram exibidas as belezas do Vale do Loire, Champagne e Provence. No mesmo ano, revelou a cultura e os costumes dos moradores do Vietnã, Laos e Camboja. Passou também por Myanmar, no sul da Ásia, onde fez reportagens sobre o misticismo na região.

As paisagens do Reino Unido, Suécia e Lapônia foram temas do Globo Repórter em 2014.

No ano seguinte, a jornalista mostrou as belezas de Marrocos, como a cidade azul, Marrakesh, os encantadores de serpente e a colheita do argan feita pelas cabras. Cruzou o deserto do Saara em um dromedário e mostrou a vida dos povos nômades.

Em 2016, visitou a Jamaica, onde teve a oportunidade de entrevistar o campeão mundial de atletismo Usain Bolt e participou dos rituais de uma comunidade rastafári.

Em 2017, Glória Maria foi à China e fez matérias em Hong Kong, onde cuidou de um panda gigante, e pulou do mais alto bungee-jump do mundo em Macau, com 233 metros de altura.

Em setembro de 2019, Sérgio Chapelin se aposentou, após 23 anos no Globo Repórter. A partir daquele mês, Glória Maria passou a dividir a apresentação do programa com a jornalista Sandra Annenberg.

Convite da Unicef e homenagem no Rio

Em 1998, Glória foi convidada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância e a Juventude (Unicef) para ser uma das apresentadoras de um concerto beneficente para a Etiópia.

Dez anos depois, em 2008, ela recebeu uma homenagem da Câmara Municipal do Rio de Janeiro com a Medalha Chiquinha Gonzaga.

“Viver para ser livre”: para Mano Brown, Glória contou sua trajetória e como descobriu câncer


“A gente acha que algumas pessoas são imortais, “imorríveis”. E, na verdade, elas são (…) são pessoas que não saem do nosso imaginário, da nossa referência”.

Foi assim que Glória Maria, que morreu nesta quinta-feira (2), se referiu a personalidades como Freddie Mercury e Michael Jackson, sem imaginar que o mesmo poderia ser aplicado a ela um dia.

A declaração foi dada ao cantor Mano Brown, em uma longa entrevista de mais de duas horas no podcast “Mano a Mano”. Na época, dezembro de 2021, Glória Maria tinha terminado um processo de dois anos de recuperação de um tumor cerebral que a tirou da TV.

“Hoje eu sou uma fênix, a verdade é essa”. De lá para cá, Glória viveu por pouco mais de um ano com sua energia indiscutível, fazendo todos se questionarem sobre qual o segredo da sua saúde, que a abasteceu com “gás” suficiente para viver a vida “como tem que ser vivida”.

Do subúrbio do Rio aos quatro cantos do mundo: a jornalista pisou em mais de 160 países, sempre enfrentando o medos.“Eu nunca tive atitude de vitimismo, eu tive de enfrentamento”, disse.

Foi assim que avançou na sua jornada, buscando sempre o próximo passo: “Quero saber até onde eu posso me desafiar e me conhecer. Porque o medo, caramba, o medo muda tudo. O medo faz você conhecer o outro lado da sua alma”.

"Minha avó dizia: a nossa história sempre foi de correntes, então você não pode permitir, nunca, que te acorrentem. Você tem que viver para ser livre, sempre, a qualquer preço, a qualquer custo"

Infância e juventude

Nascida no subúrbio do Rio, Maria – como sempre quis ser chamada, mas o nome nunca vingou – aprendeu a história da escravidão longe dos livros.

Foi sua família que a ensinou, por experiência própria. Esses ensinamentos permaneceram com ela por toda a vida e a moldaram. “Minha avó dizia: a nossa história sempre foi de correntes, então você não pode permitir, nunca, que te acorrentem. Você tem que viver para ser livre, sempre, a qualquer preço, a qualquer custo”.

E foi assim que, corajosa, construiu suas verdades e, alheia aos comentários depreciativos, trilhou seu caminho pioneiro. Desbravou tudo sozinha, sempre fazendo o que tinha vontade.

Carreira no jornalismo

Glória contou a Mano Brown que, se não tivesse sido jornalista, seria cantora. Mas os caminhos da vida tornaram o jornalismo uma opção indiscutível.

Para ela, era uma arte: “A arte de pensar, de falar, de se autoanalisar, a arte de olhar para o outro”.

Começou na rádio escuta da TV Globo no Rio de Janeiro, sem receber qualquer salário. Por lá, ficava das 7h às 20h e ainda emendava com outro trabalho.

Depois, virou repórter – a primeira negra a aparecer ao vivo e a cores no Jornal Nacional – sem saber que estava fazendo história. Conheceu o Brasil “como ninguém” e se aventurou pelo mundo.

De guerras na América do Sul, passando pelo Himalaia até o interior da Sérvia, onde aconteceu um dos episódios mais marcantes da sua jornada.

“Conheci uma senhora de quase 100 anos que nunca tinha visto um preto. Ela passava a mão no meu rosto e no meu cabelo e dizia: “Não vá embora, você não sabe a felicidade que me deu de poder morrer sabendo que você existe”, contou Glória.

Mas nem tudo foram flores.

Nos anos da ditadura militar, em que chegava na redação e descobria o que podia ou não ser falado naquele dia, teve, mais uma vez, que enfrentar as adversidades que eram agravadas pela cor da pele.

“Aquela neguinha não pode chegar perto de mim” – era o que falava João Batista Figueiredo, o último presidente da ditadura, quando a via. “Me espanta as pessoas pensarem na volta da ditadura. É como se a gente voltasse para o inferno. Meu Deus do céu, ditadura nunca mais”, desabafou Glória a Mano Brown.

Exemplo e referência

Michael Jackson, Freddie Mercury, Madonna, Leonardo Dicaprio, Nicole Kidman.

A lista de famosos que Glória entrevistou é imensa. Mas quem mais a marcou foi Michael Jackson. Usando a irreverência e a humildade a seu favor, como ela própria explicou, conseguiu quebrar o gelo e conversar com o rei do Pop por mais de 15 minutos.

“Sentada ali no chão com ele, descobri que não ficou branco porque quis, como as pessoas assumem. Ele tinha vitiligo em 80% do corpo, e tinha sofrido uma queimadura muito grave em uma gravação. Era inevitável ficar branco”.

Foi assim também que chamou a atenção de Madonna e de Freddie Mercury e inspirou várias gerações de jornalistas com seu jeito único de exercer a profissão.

Com o passar dos anos, ela criticou a busca exagerada por “coisas erradas” como alimentar o ego e falou de uma cultura de superficialidade.

“A gente está com uma geração muito sem afeto em vários sentidos (…) falta vontade de fazer alguma coisa de verdade. É a cultura do supérfluo, a cultura da bobagem. Assim, sua alma não cresce, você vai ficar no raso o tempo todo”, analisou Glória no podcast.

Uma dose de “sobrevida”

Em novembro de 2019, Glória caiu e descobriu que tinha um tumor que a mataria em 15 dias se não fosse operado: “Eu pensei: vamos lá, é a minha vida, minha história e eu não gosto de drama, a vida é intransferível”.

De lá até o dia de sua morte, viveu um turbilhão de emoções com o falecimento de sua mãe e o afastamento das telinhas, na época que, segundo ela, foi a mais desafiadora de sua vida.

Ainda chegou a apresentar o Globo Repórter, em maio de 2021, quando todo mundo duvidou dessa possibilidade.

Para Mano Brown, disse que não gostava de se queixar e que tinha que viver para experimentar “outro pedaço” da sua existência. E foi isso que fez, depois de uma vida de “tempestade, furacão e turbilhão”.

Glória Maria deixa legado e Pedro Bial e amigos prestam homenagens!

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Roda Viva | Glória Maria | 14/03/2022
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PODCAST MANO A MANO | MANO BROWN RECEBE GLÓRIA MARIA
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